Bom Comportamento (2017) - Crítica


Bom Comportamento inicia com um close de rosto lento e estático onde, sem entender nada, vemos um homem de face dormente e débil, e se isso ainda não confirmava sua deficiência mental, esta é ratificada quando o corte mostra um psiquiatra o testando. A cena, pacífica e letárgica, é abruptamente interrompida quando outro homem, de aparência maltrapida, olhar vidrado e palavras rápidas, adentra o recinto e, de modo impaciente, retira o doente da cadeira sem justificativas.

Os dois são, depois descobrimos, irmãos, interpretados por Robert Pattinson (Connie Nikas) e Bennie Safdye (Nick Nikas), também diretor do longa. O caso é que, assim que ambos saem apressados do local, o filme acelera para não parar por um bom tempo. Basicamente em toda sua duração, o que nos engloba em uma sinestesia de urgência claustrofóbica e brutal sem nem nos darmos conta do absurdo de situação em que Connie se envolve para posteriormente tentar resgatar seu irmão de um hospital.

Resgatar novamente, como fora na cena inicial. Assim como habitual na carreira dos irmãos Safdie, que novamente filmam em quatro mãos, Good Time é um retrato conturbado e caótico de vidas abandonadas e discriminadas, sem realmente ter um propósito nem ninguém, a não ser um ao outro. É uma relação sintagmática, e que mesmo na natureza demente de um dos dois, não poderia ser considerada parasitismo justamente pela dependência afetiva de Connie para com Nick, que deixa de ser um fardo, o que seria natural para outros cuidadores, e sim uma baliza de apoio, sem a qual se encontra perdido e desesperado.

Os cineastas sempre trabalharam nesta modalidade, como estudo de personagens ambíguos e ladeados, meio perdidos, meio conformados, sem a real intenção de mudar, apenas seguindo em frente sem plano algum, e é exatamente isso que Connie faz em sua busca pelo irmão. Como quem passa de fases ou vai fazer uma prova sem estudar, ele improvisa onde está com o que tem para ver o que vai dar, o que naturalmente não encontra as resoluções desejadas.


Deste modo, a estética idiossincrática da dupla não apenas se adéqua bem na realidade de seus personagens, como é uma franca e orgânica evolução em sua filmografia, com a mesma identidade vista em "Amor, Drogas e Nova York", com mais inspiração no desenvolvimento narrativo.

Banhado  no thriller de perseguição, ainda que haja o drama implícito no objetivo principal de Connie, que assume o protagonismo através do galã Pattinson, em seu melhor esforço na carreira e que merecidamente o fará crescer em prestígio na indústria, não sentimos devidamente pena pelos acontecimentos, e sim a mesma euforia e agonia regada a ácido do personagem, onde inevitavelmente esquecemos o caráter de seus atos e embarcamos numa jornada pessoal e familiar, já que os coadjuvantes não recebem corpo o suficiente para se assumirem como seres vivos, e sim obstáculos invocados para descontinuarem o avanço trôpego da história. É uma escolha - deliberada, obviamente - que fornece contornos quase cômicos pra uma trama cujas camadas inferiores são mais sérias do que o superficial.

O propósito que perde-se de vista na alucinação perturbadora da câmera de mão, em uso enlouquecedor, porém estável e esclarecido, é que falta destino. É uma busca em vão, analiticamente absurda, como é o absurdo da vida de suas figuras centrais, onde se movimentam para não haver tempo de refletir o vazio e a desgraça de como se encontram. Um faz companhia ao outro justamente para preencher espaços e ter alguém a quem olhar sem surtar com o reflexo miserável de si mesmo.

Não à toa, quando parecem finalmente pausar a esquizofrenia e se veem obrigados e encarar onde foram parar, é que a expressão de seus olhares mostra quem realmente são.


Nota 8. 

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